2004-10-28 12:26:00

       
  

É tudo verdade

Minto.Minto muito.Não por falha de caráter nem
desvio genético, mas pela minha condição que dizem ser a humana.Todos
mentimos desvairadamente ao longo de nossas vidas, seja por interesses
próprios ou mesmo coletivos.Sim, a mentira não é um mal em si e tem lá
seus valores , até mesmo altruísticos, eu diria. Mente-se por motivos
nobres, desde pequenas mentiras, como quando dizemos a um amigo feio e
limitado que ele tem lá suas virtudes de sedução, até por motivos
grandiosos, como quando damos um sorriso complacente de otimismo a um
doente terminal.

Os exemplos abundam e seria desnecessário desfiar o
rosário de pequenas e grandes mentiras necessárias. Mas a mentira também
é um fator de sustentação social.Sem hipocrisia, claro, não haveria
civilização, já dizia não sei quem com muita propriedade.Imagine se
todos nós nos falássemos a verdade sobre o que pensamos uns dos outros o
tempo todo?Não sobraria um ser vivo na terra.Quem já não quis esganar
um parente, um grande amigo ou uma namorada por certas diferenças? Mas
não esganamos; sempre é de bom tom darmos um sorriso complacente e
perdoarmos aquilo que não compensa a perda de uma amizade ou de um amor.

A sinceridade desbragada é um mal tão grande quanto a
mentira deslavada.Até por que a sinceridade é uma meta utópica.Ninguém
se conhece suficientemente bem para poder dar uma opinião precisa de si
mesmo, não?Então como podemos ser verdadeiros a respeito do que nos é
alheio?Posto que ninguém conhece a verdade sobre si, o conceito de
sinceridade torna-se primitivo.A plena sinceridade nada mais é que a
exteriorização de nossos instintos primitivos sobre nossas
impressões daquilo que intuímos.E em nome desta suposta
virtude, ‘’a sinceridade’’, chegamos a magoar pessoas e destruir egos.A
sinceridade , se não dosada e devidamente amestrada, nada mais é que uma
grosseria retumbante, originária de nossa vaidade em cuspir nossas
pequenas verdades pessoais a quem quer que seja. Sinceridade em excesso é
exibicionismo patológico.

Aprendi a duras penas que o único tipo de sinceridade
absolutamente possível só se dá no amor, no ato de amar.Quando amamos
alguém, somos forçados a sermos sinceros, a evidenciarmos nosso
sentimento.O amor é uma verdade primitiva que prescinde de explicações
lógicas, que fala por si; é a única verdade possível que , por
conseguinte, nos fornece o único meio real de sermos absoluta e
visceralmente sinceros sem exaltarmos nosso ego, sem prejuízo de
causa para a verdade, porque o amor é a única verdade que
existe(sinceridade e a verdade-em si- não são a mesma coisa).Justamente
porque amar é a única forma de se desprender do próprio ego, é a única
vez em que nos preocupamos mais com algo externo(o ‘’objeto’’ amado)que
conosco. E digo mais: este tipo de sinceridade, a do amor, em geral não
nos trás nenhuma recompensa.Ao contrário: nos expõe a fragilidade,
nos coloca nús, à deriva, à mercê da própria sensação de impotência, à
mercê da pessoa amada;é um tipo de sinceridade incondicional, que se
impõe a todos os que amam, por isto a única sinceridade
verdadeira.Acreditem-me, falo por experiência própria.Só se é sincero de
fato quando se ama.Estou sendo absolutamente sincero.

  

2004-10-24 13:39:00

       
  

A ressaca da entressafra

Nasci sob a égide de uma das piores
gerações da história da humanidade:a geração da ressaca da entressafra,
póstuma à deterioração dos valores e do pensamento, póstuma à própria
decadência.A falta do que dizer, o esgotamento do pensamento humano,
típicos de fim de século e mais aterradores ainda em fim de milênio são
as marcas da minha geração.Nenhum gênio, nenhuma inovação, nenhuma
revelação, no máximo algum talentinho aqui e acolá que repete algumas
coisinhas com estilozinho melhorado.No fim do primeiro milênio,
pensava-se que o mundo iria acabar.Esta era a crise.Hoje talvez o
problema seja a consciência de que ele ainda vai continuar, sabe-se lá
como.

O tempo é de marasmo e tédio.Depois da contacultura e
dos modernismos estéticos, dos descontrucionismos afins, vamos
construir o quê, afinal?Os anos 80 já foram um desastre absoluto, o
ápice da cultura pop, da cafonice generalizada, a década do ‘’yuppie’’
engomadinho e desencantado de quaisquer ideologias que estejam além do
próprio bolso.Os 90 foram piores, simplesmente porque não tiveram cara,
não tiveram definição.Neo- liberalismos se somaram a neo-esquerdismos de
universitários abobados que quando não participavam de passeatas ,
reivindicavam aumentos de mesadas ao papai.

É emblemático:quando há uma profusão de ‘’neos’’, é
porque não há nada de novo, a não ser o que é velho, remastigado e
piorado.Continuamos a viver na indefinição.O mais recente conceito que
se aplica aos últimos cinquenta anos é o ‘’pós-modernismo’’.Faltam
substantivos novos à nossa época e sobram pronomes de apoio(neos, pós)
para denominar o que não sabemos.

Ou melhor, sabemos sim, mas temos preguiça de
conceituar por aversão mesmo, por não vermos o vazio em nos enfiamos.A
tragédia da minha geração é o tédio, a letargia de querer descobrir o
óbvio ululante de que, na desconstrução dos sentidos, perdemos nossa
razão de ser.A humanidade se sustenta através dos sonhos , das ilusões,
representados pela arte, pela religião, pelas utopias, que há muito se
perderam no caminho.Olhar no espelho é incômodo hoje, porque dói
descobrir que envelheçemos mal.Todos nós.O botox que usamos durante
séculos perdeu a validade.

O tédio é um mal tão grande quanto o fanatismo das
verdades absolutas.Nosso tempo é uma nova idade média(na falta de novos
substativos…) às avessas.O excesso de informação criou a preguiça e
deu margem a um novo tipo de obscurantismo mais pernicioso que o da
idade média.Naquela época a ignorância era consequência das condições
históricas.Hoje a ignorância é uma escolha de uma maioria entediada e
preguiçosa.

A máxima socrática do ‘’só sei que nada sei’’ foi
deturpada.Deixou de ser uma condição primária para aquisição de
conhecimento para se tornar apologia da imbecilidade.Precisamos de um
novo Sócrates, menos sutil e mais incisivo.

  

2004-10-21 21:16:00

       
  

Entulho

Pesa ainda sobre teus ombros a perene espera da esperança

Ainda te consolas em postergar o presente,

em reinventar o passado,em sacralizar o futuro.

 

 Saboreias com prazer a já neutralidade da tua angústia,

Pois bem sabes da marcha triunfante de tua ilusão

Tua mágoa já lhe soa pífia, posto não sobreviver

à  construção dos teus castelos invisíveis.

 

Estás só ,perdido, mas insistes em desbaratar o caminho

Epifânico cegueta,,arrancas da derrota

o parto da tua pretensa ascesce privada

 

Continuas a paulatinamente

reinventar teu próprio personagem

saboreando esgares

ao prazer de tua atuação sempre renovada

 

Participas agora efetivamente

Sem maiores  esclarecimentos

Como  a criança que sentiu o adulto virar farsa.

  

2004-10-17 12:43:00

       
  

Religar o quê a quem ou ao quê?

”Teologia é um ramo da literatura de realismo fantástico”(J.L. Borges)

 

Tive o assombro de presenciar na televisão uma das
cenas mais dantescas, dignas do último nível do inferno do autor
italiano:o padre Marcelo Rossi, com o olhar fixo e imutável lançado aos
céus desfiava uma espécie de novena em que rogava à Deus que abençoasse a
todos os espectadores do seu último filme. ‘’Senhor, abençoai a todos
os que virem o filme’’, repetia inúmeras vezes o padre em tom de súplica
emocionada.Mais aterrador que isto, só mesmo as sessões de exorcismo e
as entrevistas com os ‘’encostos’’ da tv Record .E pensar que o próprio
Jesus Cristo expulsou os vendilhões do templo em sua época.O que acharia
ele dos que fazem do próprio templo um balcão de negócios hoje em dia?

Nada contra a religião ou o cristianismo em si.Pelo
contrário, acho que a religião é um elemento necessário e fundamental à
humanidade.É preciso acreditar em algo que transcenda a matéria, mesmo
que este algo não tenha embasamento ou respaldo científico.A religião é
uma espécie de ‘’álcool’’ virtuoso que embriaga e faz bem à alma.

Mas também a religião é o terreno mais fértil para
toda sorte de picaretagens, porque trata-se justamente de uma matéria
incorpórea, sujeita às interpretetações mais subjetivas
possíveis.Partindo do pressuposto de que exista algo que transcenda a
humanidade(pressuposto pelo qual eu comungo também), tudo pode ser dito,
tendo em vista os mais diversos fins.O instinto primitivo de que existe
um ‘’Deus’’ ou ordem superior, ou seja lá o que for é quase uma certeza
instintiva. O ser humano é carente por natureza, não consegue se manter
de pé sozinho e teve que inventar Deus à sua imagem e semelhança para
que este o inventasse em seguida.É aquela velha história:’’se Deus não
exisitisse, seria preciso inventá-lo’’.

Se foi ou não necessária a invenção de Deus, eu não
sei, nem ninguém sabe.Instinto não se discute, mas religião sim, ao
contrário do que se diz, e deve ser discutida.Meu problema é com o que
fizeram com este instinto da ‘’ordem divina’’.Por mais boas intenções
que possam ser levadas em sua conta(o amor ao próximo, a
generosidade) não consigo ter grande respeito pela teologia, seja de que
igreja for, de qualquer crença.A(s) teologia(s)Sempre me pareçeu um
arcabouço filosófico em cima do nada, da criação humana que parte do
instinto de bondade, do amor ao próximo, etc, mas que no fim das contas
se traduz em uma espécie de literatura surreal que se pretende verdade
absoluta.Uma piada humana com pretensões divinas.

Por isto o mais pedante e pretensioso tipo
de erudição é a erudição religiosa. Em nome de uma série de postulados e
dogmas mais que duvidosos, atrocidades, injustiças e explorações
sórdidas já foram cometidas.Claro que alguns postulados religiosos como o
bem , a generosidade, o amor são prefeitamente louváveis.Mas pergunto
se estes elementos, tais como o sentimento da presença de ‘‘algo maior’’
em nossas vidas não seriam também da ordem do instinto humano, ou
seria, por exemplo, o amor, um fenômeno ‘’cultural’’?Creio que não.

Não é preciso desfiar aqui o rosário de explorações e
 deturpações de todas as igrejas ao longo da história, por que
estão ao alcance de todos. Das atuais, nem se fala.Basta ligar a
TV.Repito que não tenho aversão à religião, mas tenho profundo desprezo
por certos religiosos sórdidos e também uma certa inveja(sim,
inveja) do conforto  revigorante que deve dar
a pessoas crédulas acreditar piamente em expicações
metafísicas de sumas teológicas.A fé alimenta a esperança e a vida
de muito gente e neste sentido é e sempre será necessária .Mas também
alimenta o bolso e a vaidade de muitos aproveitadores, que não são
poucos e se multiplicam aos milhões.

Não vou me omitir:acredito em Deus ou seja lá o que estiver acima da
minha cabeça, mas desconfio Dele.Minha crença é curiosa, mas acho que
não estou só neste viés:acredito em Deus mais por necessidade mesmo do
que por crença absoluta.

  

2004-10-14 02:32:00

       
  

A lata de sopa Campbell não recontextualizada

 

 

Nos anos 60 a arte pop ajudou a reconfigurar toda a estrutura que dizia respeito 
ao lugar da arte na sociedade contemporânea.Na esteira de
Beckett e Marcel Duchamp, todos os pressupostos que definiam a arte,
todas as tradições e definições estéticas foram colocadas em cheque.O
consumismo, a publicidade, pelos quais muitos eruditos torciam o nariz,
foram recontextualizados e tiveram, ainda que de forma irônica e debochada,
um lugar decisivo na história da produção artística, como uma espécie de sarcástica
celebração do vazio da sociedade de consumo.

 

E por que não?Qual seria a raiz da invenção
artística?A invenção, a contestação?Arte é reflexo,mais
que criação.O humano já está dado e  o que
pode é  ser descoberto pela arte.Neste sentido,uma lata
de sopa recontextualizada pode sim ter um significado de contestação
social tão intenso quanto um quadro de Munch ou um romance de Zola.A
arte pop deu uma banana para os postulados >contribuiu para a contestação dos valores
tradicionais da sociedade.Não apontou respostas para nada, mas através
de seu caráter iconoclasta, apontou um caminho de liberdade e
relativização.

 

Quarenta anos depois, no que deu tudo isto?Em tudo e nada, como era de
se esperar.No campo artístico, vimos desde a evolução de gênios como
Jean-Luc Godard, como as mais diversas manifestações de picaretagem, como é o
caso flagrante da decadência das artes plásticas que hoje se verifica com instalações
estapafúrdias  e manifestações picaretas aos montes.A necessidade de um subtexto que
alicerce a obra artística é apontada como a influência mais nefasta da arte pop.Mas desde
quando a arte se mantém sozinha sem um arcabouço histórico, social, político, etc?Desde quando
uma obra de arte se equilibra sozinha?Nunca entendi direito o conceito de ”arte pela arte”, que sempre
me soou masturbatório e vazio.
 

 

Mas o triste mesmo, meus caros, é percebermos que no campo político, a
coisa não mudou nem evoluiu.Vemos um presidente semi-analfabeto, o Sr.
George Bush jr. jogar fora(e ele lá guardou?) toda uma sorte de
questionamentos éticos, sociais, psicológicos produzidos pela iconoclastia
cultural do séc.xx.

 

É a lógica capitalista, imediatista, pragmática, que tem o seu auge na
administração Bush.Realmente o relativismo que reinou absoluto no século
passado há muito já saturou.Mas voltar a um primarismo elementar de valores
absolutos é demais para o meu fígado.É a volta do brucutu travestido do
simples ,do elementar.E não há NADA elementar, meus caros.Tudo é
relativo, até o absoluto.

 

Na cabeça(esta sim elementar e simplória) de Bush, vivemos uma época de
luta entre o bem e o mal.Mas o que é pior?O barbarismo medieval religioso ou
o barbarismo medieval do capital?A intolerância religiosa do Al qaeda ou a
intolerância do capital contra a miséria?Ah, sim, o capitalismo permite uma
certa margem ”tolerável” à exclusão social.Ah, meu fígado…

 

A era Bush é a volta consolidada do conservadorismo prosaico, é a apologia das platitudes, do raso, da não
contestação.Bush é a lata de sopa Campbell não-recontextualizada.Tomara que 
seus quinze minutos de fama já estejam no fim.

  

2004-10-10 02:28:00

       
  

O grande culpado é José de Alencar

O primeiro grande culpado é José de
Alencar.Não bastasse o escritor ter quase matado o prazer de muitos pela
leitura na tenra infãncia com sua literatura melíflua e tediosa, o
homem ainda foi o primeiro a instituir o gosto pelo romantismo no Brasil
e a idéia de um nacionalismo utópico, ufanesco e apalermado.As donzelas
castas que guardam a honra como quem guarda os secretos tesouros
nacionais, os indiozinhos bons moços, europeizados e quase super homens
que simbolizam o orgulho da raça e outros tipos medonhos compõem a
‘’fauna’’ mais deletéria da história da literatura brasileira.E é a
leitura deste escriba que é indecentemente imposta aos adolescentes no
país inteiro.Depois vêem se queixar que o jovem brasileiro não lê.Depois
de um trauma destes, quem é que vai se aventurar a pegar em outro livro
na vida?

A influência nefasta de Alencar é imensurável e se
expandiu pelos quatro cantos do país.Alencar foi o pioneiro,
praticamente o inventor do nacionalismo brasileiro.Nada pior para uma
nação que o nacionalismo. O patriotismo é o grande refúgio da
mediocridade. O ufanismo é o terreno fértil para que os que nada pensam
ou têm a dizer, através do orgulho patriota venham a Ter um motivo para
dar voz plena e politicamente correta à imbecilidade. Alencar deu frutos
como a célebre frase dos sertões ‘’o sertanejo é , antes de tudo, um
forte’’.É nada. O sertanejo é um fraco, o urbano é um fraco, o ser
humano é um fraco.A ‘’força’’ que porventura possa aparecer Vém da
necessidade, da miséria, da falta de opção e está longe da
grandiloquência de Euclides da Cunha.Seria mais conveniente dizer que o
sertanejo é um faminto que se faz de forte, senão morre.

A única saída para a contrução de uma sociedade
suportável é a autocrítica, o avesso do romântico-nacionalismo babaquara
de Alencar.Só se contrói algo decente, seja uma nação, um grupo, uma
pessoa, através da consciência dos próprios erros, do próprio ridículo.O
ufanismo é o berço dos totalitarismo,da demagogia, da
megalomania.Hitler e Mussolini estão aí para confirmar o que digo.

Por isto tenho engulhos toda vez que vejo esta
campanha publicitária execrável do governo federal que faz apologia ao
brasileiro, enaltecendo os ‘’vencedores da pátria’’ como autênticos
brasileiros ‘’que não desistem nunca’’.Melhor seria o avesso:mostrar os
perdedores, os que se estrepam, os que desistem por falta de opção e de
oportunidade.Melhor seria botar o dedo na ferida, que, por sua vez, é
muito maior que a parte saudável do ‘’corpus’’ nacional.Para cada
vencedor, há um milhão de vencidos no Brasil, não por falta de talento,
mas por falta de competência e de vergonha de uns e outros que agora
fazem programa de auto ajuda para a nação tupiniquim., como um bando de
neo –Policarpos Quaresmas da terrinha.

Mas repito:o culpado primeiro é José de Alencar.Toda a ironia de um
Machado de Assis ou de um Lima Barreto não foram suficientes para apagar
a influência nefasta do escriba adorado pelos ufanistas.O culpado é
José de Alencar.O resto veio depois e o que é pior:continua vindo.


  

2004-10-06 10:34:00

       
  

O odor suspeito da esquerda

A cara balofa, pastosa, a barba por
fazer,o cabelo oleoso, o aspecto de dois ou três banhos atrasados do
festivo Michael Moore ratificam o que vários pensadores libertários já
disseram:embora as intenções das pessoas de esquerda sejam em princípio
mais louváveis que as de direita, a companhia destas últimas ainda é
preferível.Pessoas de direita são, no geral, mais asseadinhas, mais
gentis no trato pessoal,a conversa delas é mais agradável e tomam
banho todo dia.

Na verdade esta dicotomia esquerda–direita só
permanece mesmo no campo estético.Ambas nunca foram tão parecidas,
parecendo convergir para um centro indefinível, onde poucas diferenças
se mantém, com certo prejuízo da esquerda.Reparem:a ideologia morreu,
sucumbiu ante o peso do pragmatismo das questões administrativas.O
discurso esquerdista ainda permanece mais bem intencionado, mas as
políticas de direita mostram-se mais eficientes e eficazes.O inchaço da
máquina estatal fez com que conservadores e libertários concordassem
amplamente no que diz respeito à redução do estado (se não concordam no
mérito, concordam na prática.Alguém contesta?).

O resquício das boas intenções da esquerda estão se
diluindo em puerilidade, quando não resvalam no ridículo mesmo.A
pusilanimidadde disfarçada de tolerância,que permite que tratemos com
doçura terroristas assassinos, o viés antropológico que nivela Bach à
Amado batista são alguns pontos que confirmam o caráter esdrúxulo de
certo pensamento das esquerdas.

A esquerda é hoje como um executivo enrustido,
vestido de Giorgio Armani, que usa brinco no nariz e cabelo rosa-choque,
indeciso entre a elegância e o exótico, como alguém que tivesse
vergonha da própria elegância e sobriedade e buscasse desesperadamente
um certo estilo anti-convencional, moderno, sem saber direito o que é
isto.O resultado é uma espécie de Drag Queen de gravata e mocassins, um
Frankenstein hamletiano.

Não é o caso de abandonar os temas sociais  e
adotar o cinismo e a indiferença como estilo de vida.Mas uma coisa é
certa:esteticamente a esquerda fracassou.A direita é cínica e nefasta em
certa medida, mas seu cinismo contrasta com a ingenuidade e certo mau
gosto mesmo da esquerda, que confunde humanismo com
cafonice.Explico:preocupar-se com a fome na Etiópia não significa
vestir-se como um guerreiro Zambule, nem trocar Wagner por tambores e
berimbaus;interessar-se pela cultura indígena não significa nivelar a
vida dos nambiquaras à dos filósofos da grécia antiga, muito menos se
vestir como um pajé de Shopping center.

Enfim, moral da história:é louvável e necessário
estar ao lado dos interesses dos desfavorecidos, mas também é preciso
tomar banho.Todo dia.