A psicanálise no divã
A definição de psicanálise em termos
populares é muito simples:é o método da candinha aplicado com
sofisticação e adorno intelectual.E pago, claro.A análise consiste
fundamentalmente na cura pela fala, no reconhecimento verbal das
próprias limitações e problemas;uma espécie de fofoca sofisticada ao
contrário, em que o objeto das minudências indiscretas é o próprio
analisado.
O problema é saber exatamente o que esta ‘’cura ‘’ em
questão significa.A grosso modo,uma terapia não resolve problemas
concretos, mas o ajuda a se adaptar a eles.Exemplo:alguém com limitações
físicas, um maneta, não recuperará a mão através da terapia, mas
trabalhará seu ego através da sublimação da falta que a mão lhe faz,
investindo no seu ego.Mas ainda assim, a mão não volta.O problema
concreto persiste.Ou seja, a psicanálise o ajuda a se adaptar aos
seus problemas,mas não o livra deles. Por isto a minha desconfiança
e uma certa descrença na terapia.Cá pra mim, sei que milagres não
existem, mas prefiro acreditar neles que me adaptar às minhas limitações
e problemas.Um paradoxo idiota, eu sei, mas metafisicamente
reconfortante.
Tanto é assim, que a única vez que procurei uma
analista, busquei uma que fosse Junguiana, justamente pelo lado meio
‘’místico’’ de Jung, que foge um pouco do rigoroso e cético
cientificismo Freudiano.Minhas primeiras palavras à ela foram
justamentes as penúltimas do final do último parágrafo:’’preciso de um
milagre.Não quero me adaptar aos meus problemas; sei quais são e são
praticamente insolúveis.O que você tem a me oferecer?’’.A senhora em
questão polidamente sugeriu a hipótese de jogar as cartas para
mim.Tarô.Dei meia volta e abandonei minha primeira e última sessão de
análise.Gosto de acreditar em milagres, mas não a este ponto.Prefiro me
enganar de maneiras mais sutis.
Oh, por favor, nada contra Freud, que considero o
maior pensador do século xx, o último grande divisor de águas da
história do pensamento.Nosso querido Sigmund abriu as portas para um
mundo novo na história da psicologia, descobrindo o subconsciente
humano,e que ninguém é tão normal quanto aparenta, nem tão louco como se
imagina.Tudo, claro, é uma questão de convenções socias, que delimitam o
que é ou não é ‘’saudável’’ do ponto de vista de comportamento.
Até aí tudo bem.Freud demonstrou perfeitamente este estado de
coisas.Mas sou cético em relação a seus métodos de ‘’cura’’, como já
disse.Sou megalômano social, no fundo um romântico pateta, que acredita
que a sociedade pode mudar, em vez de me adaptar aos padrões sociais de
comportamento.Estou sendo simplista e limitador, eu sei, mas isto é
decorrência de outra desconfiança minha em relação à Feud e à
psicanálise.Explico:a psicologia nos leva a crer que todo ser humano é
um vasto e infinito mundo em si.Acho que isto é supervalorizar a
humanidade.Somos mais elementares e parecidos do que pensamos ser.Todos
desejamos mais ou menos as mesmas coisas, com maiores ou menores
gradações e sutilezas:dinheiro, amor, fama, sexo, etc, etc.Esta
‘’superestimação’’ do ser humano pela psicologia levou a encobrir certas
atitudes e defeitos de caráter de muita gente que posa de ‘’maluco’’,
quando na verdade é sem vergonha mesmo.Em suma, Freud era um gênio.Mas
encheu demais a bola do ser humano.De tanto falar em ego, transformou a
geração de um século inteiro em egocêntricos.Mais uma prova de que o
método de cura da ‘’falação’’ às vezes não só não resolve problemas
concretos, como às vezes ainda cria neuroses a mais.Ainda mais grave
quando se pensa que , no caso, era a humanidade inteira é que estava no
divã.