Homenagem quase necrófila a um quase sucesso
Pior que o fracasso, só um quase
sucesso .O maior exemplo disto é o bateirista Pete Best.Quem mesmo?Best
foi o bateirista original dos Beatles que foi despedido no começo da
carreira do grupo e substituído por Ringo Starr.Amargou anos de
ostracismo, de esquecimento, e o que é pior:sempre lembrado a todo
instante do sucesso que quase teve, da fama que quase alcançou.A
tragédia de Best se resume nesta palavrinha:’’quase’’.Imaginem o pobre
sujeito tentando se esquivar do tormento do seu quase sucesso que lhe
foi podado pelo destino.Imaginem Best tentando fugir da imagem de
sucesso avassalador dos Beatles que o perseguia;o pobre sujeito se
escondendo lá no Tibet , escutando mantras e fazendo Yoga, quando um
desavisado ligava o rádio e tocava ‘’help’’ do seu lado.Pobre Best.A
vida não lhe foi leve.E o que é pior:que eu saiba, o homem ainda vive, e
continua sendo perseguido pelas canções do grupo aonde quer que esteja.
Não por acaso, Best tentou o suicídio várias vezes.Já
é duro sobreviver de passado, mas é trágico viver de um passado quase
consumado, de uma expectativa do que poderia ter sido e não foi.Best se
transformou na sombra de uma possibilidade frustrada.Mais humilhação que
isto eu não poderia conceber.O pobre não pôde sequer fugir de seu
pesadelo, já que a música dos Beatles permanece até hoje.É duro.
Mas não riam com sorrisos de escárinio nem tenham
tamanha pena do pobre Best.No fundo, ou na superfície mesmo, todos
sobrevivemos de certas expectativas frutradas, de certos sucessos não
consumados.A expectativa é nosso motor, e a expectativa não sobrevive
apenas do futuro, do porvir, mas também do que poderia ter sido.Este
negócio de aprender com o fracasso é balela politicamente correta.A
derrota, a dor não nos ensina nada, a não ser o fato de que o fracasso
pesa e de que a dor ‘’dói’’.Sim, sim, toda perda tem um gosto de
redundância ridícula, de pleonasmo patético.Aprendemos que a vida não
tem critério ou sentido, e este é o único aprendizado concreto que o
fracasso nos dá.Sublimamos as perdas, mas não as esquecemos nunca.
Ainda mais doloroso que o fracasso é observar o
sucesso dos que nos circundam e que julgamos ser menos merecedores do
sucesso do que nós.É mesquinharia, eu sei, mas todos nós já tivemos este
tipo de sentimento pernicioso entranhado em nossa pele.Ele cresce e se
alastra como um câncer, o qual aninhamos e cuidamos com zelo, e se não
tivermos cuidado, toma conta de todo o nosso organismo.
O tal câncer cresce ainda mais quando constatamos
cruamente que o sucesso de uns e outros realmente não é merecido e que é
outra balela este negócio de dizer que há espaço para todos.Não há.Os
espaços são na maioria preenchidos por gente que não mereceria estar
aonde está.Não acham?Dêem uma olhadinha na mídia e tenho quase certeza
que em pouco tempo concordarão comigo.Neste sentido, até mesmo o pobre
Best é mais feliz que todos nós.Pelo menos ele perdeu a chance para
gente talentosa, para gente merecedora do sucesso que fez.E os pobres
coitados que têm certo talento(não precisa ser muito não…) e que são
substituídos por Gugus Liberatos, Xuxas, cantores de funk, escritores
medíocres, apresentedoras de tv que(por acaso, por acaso…) dormem com
os patrões.É duro, é duro.
Pete Best foi uma vítima do acaso, não tem a quem
culpar, coitado.Mas nós todos(Nem todos.Os que têm algum talentinho,
digo) somos mais coitados ainda.Temos a quem culpar e sabemos a quem
culpar mas não fazemos nada.Por descencanto, incompetência ou por não
haver nada o que fazer mesmo.
Talvez o sucesso de hoje seja o anonimato, haja vista a gentalha que
infesta os meios de comunicação.É o que sinto toda vez que ligo a
televisão ou abro um jornal nos últimos anos.Bem, mas aí já não serve de
consolo ao nobre Best.Mas que este artigo já lhe sirva de modesta
homenagem a um ‘’quase’’ bem sucedido.O mais famoso dos ‘’quase’’,
aliás:mr. Best.Ainda que de uma maneira perversa, já é alguma coisa…