2005-05-31 22:58:00

       
  

Apoteose e queda de um zé povinho simbólico

Abundam os discursos, ou pelo menos
abundavam, que dizem ou que diziam que a eleição de Lula tinha um forte
caráter simbólico.Um homem oriundo das >

Ah, longe de mim questionar as habilidades poéticas
de Zuenir ou contestar os parâmetros de Ziraldo, mas o fato é que houve
sim, a despeito de minhas pérfidas ironias, um caráter simbólico
inquestionável na eleição de Lula.O homem era mesmo legítimo
representante do populacho.Um ‘’igual’’ não só de Ziraldo, mas de todo
zé mané da esquina, vítima do eterno subdesenvolvimento brasileiro,
alguém semi alfabetizado, bonachão, falastrão, sem maiores habilidades,e
que acha que pode resover tudo no bico doce.Um legítimo brasileiro,
claro, o Sr. Lula da Silva.E deu no que deu:a comprovação de que não é
por baixo que se resolvem as coisas, a constatação de que o zé mané,
enquanto não for devidamente trabalhado, não consegue ser outra coisa a
não ser o zé mané mesmo, ainda que se torne papa, rei ou presidente da
república.

Os desdobramentos funestos da eleição simbólica
de Lula são muito mais edificantes e pedagógicos que o seu simbolismo em
si.O governo de Lula provou e prova ser inepto, antiético, incompetente
em matéria de gestão, e o que é pior, sem caráter: copiando a risca o
modelo econômico a que sempre se opôs.Sua aspiração máxima é ser um
adendo do governo passado.Com esta soma de falta de caráter e
incompetência, Lula vem paulatinamente destruindo o mito que se formou
em torno dele e de sua eleição.O que é ótimo para todos nós.Um país que
se preze, com mais de quinhentos aninhos, não pode adotar um mito
messiânico e utópico como salvador da pátria.Não dá.Já era mais que hora
de sairmos deste infantilismo elementar.A corrosão da mitificação de
Lula tem um caráter redentor para a boçalidade entranhada nos
brasileiros.Descobrimos enfim que Marx era meio ingênuo mesmo;que luta
de >

A eleição e queda simbólicas de Lula provaram que das
massas não surge nada além de um arroto ,fruto de empazinamento com
cerveja. Quando digo massas, digo em sentido geral. Lula é sim oriundo
das massas, no sentido de uma massa sem rosto, sem personalidade, sem
originalidade, ostensivamente medíocre;de uma massa que não conhece
limites de condição sócio-econômica. Se o bom e bem intencionado Lula no
passado fez piquete em porta de fábrica, também isto não prova muita
coisa a seu favor, a não ser que ele é bom de reclamar.E péssimo de
fazer, como se prova agora.Ora, bom de reclamar todos nós somos, não?
Então onde residiria o último resquício de personalidade carismática de
lula? Em suas boas intenções? Ora, eu mesmo sou um rapaz bem
intencionado.Em seu apreço popular por frango com polenta? Ora de novo,
popular por popular, o Fernando Henrique gostava de buchada de bode…

Resta então esta identificação melancólica com o populacho:o
português mal articulado, a fanfarronice e a vulgaridade latente.Foi
isto que sobrou do mito ”Lula”.E, no fundo, foram estas
características que o originaram. Lembro-me que seu adversário José
Serra também tinha origem humilde, tendo sido criado na periferia, filho
de camelô.Mas Serra havia estudado, não falava errado e não
dizia disparates. No subconsciente popular, isto
equivalia dizer que Serra havia ”traído” suas origens populares.O
verdadeiro simbolismo que elegeu lula foi o complexo de inferioridade
do brasileiro:a identificação do populacho(no pior sentido da palavra)
com alguém que lhe era seu ”igual”, menos ”igual” ao Ziraldo, mais
”igual” ao zé povinho mesmo.E é baseado neste complexo de
inferioridade e nesta identificação patética que Lula
ainda poderá ser reeleito.Alguém duvida?Meus amigos, não há limites para
o obscurantismo tupiniquim.

  

2005-05-28 13:40:00

       
  

Discussão de gosto

A origem da tragédia da falta de
gosto que impera e grassa hoje em nossos tempos se apóia quase que
totalmente no preceito democrático do ‘’gosto não se discute’’.Certos
chavões como este chegam a formar uma geração inteira de palermas.Gosto
se discute sim senhores.A discussão de gosto é a única capaz de mudar
paradigmas viciados e subverter tabus estéreis.

O que é a estética, um ramo da filosofia , que a
grosso modo nada mais que é que a discussão permanente de gostos
pessoais , coletivos?Sem ela, estamos perdidos no limbo da falta de
gosto, das convenções medíocres de padrões coletivos.O coletivo não
produz bom gosto, apenas clichês consensuais.Vejam bem , não disse mau
gosto, que este eventualmente até tem seu lugar na formação cultural e
até mesmo artística de um indivíuduo ou de um povo;disse ‘’falta de
gosto’’, o que é diferente.O próprio Nélson Rodrigues dizia que a melhor
contribuição que ele havia dado ao teatro era o seu ‘’mau gosto
agressivo’’.Alguns artistas têm o privilégio idiossincrático de revelar
sua genialidade através de seu mau gosto ostensivo, que pode ser
traduzido em uma cusparada na hipocrisia social.Além de Nélson, podemos
citar vários gostos grosseiros na história arte que deram certo como
Sade, Céline, Artaud,Balzac, Pasolini, Fellini e inúmeros outros.Há algo
de barroco neste mau gosto rebuscado e vice versa.Mas há que se ter
cuidado:a agressão artística do mau gosto é privilégio de gênios da
arte.Mau gosto de populacho é pura e simplesmente mau gosto mesmo, sem
maiores aspirações.

Mas eu falava da falta de gosto, o que é terrível.Que
pode ser interpretada também como o gosto medíocre, que impera em
nossos tempos.Reparem, não há espaço hoje para epopéias, para grandes
criações e criadores, não há mais espaço para (o termo é pedante,mas eu
gosto, ué) grande arte.Tudo se reduz ao cinismo, à ironia,a um certo
distanciamento, em razão do desapreço antropológico por verdades
absolutas.Longe de mim querer preconizar a volta a um tempo de
revelações bíblicas, mas, por exemplo, acredito que a obra de Homero ou,
mais moderninho, de Proust, falam mais ao nosso tempo que qualquer
escritor contemporâneo.Não basta ser irônico, é preciso ser trágico,
senhores.Senão, tudo se resume a uns sorrisinhos de escárnio que não
levam a lugar nenhum.Este gosto mediano da comédia fácil e ligeira,’’pós
moderna’’, aparentemente sofisticada, está nos empurrando para um
buraco de pedantismo oco e vazio.É o falso bom gosto, o gosto mediano,
potencialmente mais insalubre que o gosto vulgar, a meu ver.Como diz
Ariano Suassuna,em arte é preferível o mau gosto ao gosto médio.

Pois creio eu que a frase de Suassuna pode ser estendida a todos os
níveis da ação humana.Já viram alguém que ama mais ou menos, que se
apaixona mais ou menos, que odeia, que trabalha, que se sacrifica, que
se veste, come, namora, faz sexo mais ou menos?Já viram?Claro que já.É o
que mais existe em nossos tempos. Vivemos a cultura do mais ou menos,
do mediano.Tudo isto em decorrência da queda dos padrões de gosto em
nossas vidas, fruto de muito seriadinho da Warner, de filmes da Lassie
na sessão da tarde, de domingos inteiros de Fausto Silva e Gugu
Liberato, de livros de auto ajuda, de terapias alternativas baseadas em
cristais, e bilhões de outros exemplos.Não quero crucificar o
entretenimento vazio, coisa de que também sou adepto, às
vezes.Mas(perdoem a redundância proposital) o excesso abunda.Certo que
arte é exceção, mas o que se vê hoje é a ausência da arte.Toda vez que
se quer ter uma experienciazinha de transcendência, é preciso vasculhar
nas gavetas do passado, ressuscitar velhos tratados, reerguer grandes
obras.Assim não dá.Tempinho chinfrim e sem gosto este nosso.Credo.

  

2005-05-24 21:45:00

       
  

Saldo possível

Ainda há tempo a se perder
erros crassos a serem cometidos
desvios a serem tomados
quedas a serem erguidas
 
Ainda há vida a ser inutilizada
antes da morte que é o alvorecer da consciência
ainda há breus que iluminam desenganos
sabores insípidos a amenizar desgostos
 
Ainda há pela frente amplo espaço de fuga
o plano de um desmoronamente elaborado
a arquitetura de uma corrosão planificada
 
Ainda este esboço de um silêncio orquestrado
o monumento à paisagem fria e tácita do esquecimento
homenagem à utopia translúcida da desmemória
 
Ainda e sempre o gosto anterior ao amadurecer
a retomada irresponsável de uma infância perpetrada
antes do apodrecer dos frutos e da queda das ilusões
 
Ainda e antes do fim este permanecer estratificado
este abocanhar invisível de um momento que escapa
este agarrar inviável e complacente a uma vida que se esvai
 
Apelo irrestrito de permanência
o chamado etéreo e irresistível
de uma vida a ser inventada
de uma mentira a ser elaborada
de uma verdade a ser forjada
 
A gênese da imortalidade
pelo adiamento da realidade
O sono sonhado
contra um despertar inútil
 
Ainda
sempre e prazeirosamente ainda

  

2005-05-21 14:45:00

       
  

Pseudo arte, política e oportunismo

O pintor colombiano Fernando Botero
está realizando na Europa uma exposição de uma série de obras em que
pinta os horrores das torturas cometidas em Abu Ghraib pelos americanos
durante a guerra do Iraque.Com isto, claro, conseguiu alardear seu nome
junto ao panteão dos politicamente corretos e membros distintos da
esquerda festiva.Os tons de sua obra(ostensivamente medíocre, a meu ver)
sequer são mencionados, tendo em vista os motivos supostamente
‘’fortes’’ que representou.

Não quero negar a tortura que aconteceu no Iraque,
mas sim afirmar aqui a falta de limites da picaretagem artística que se
alastra em nossos tempos.Por que diabos Botero, um pintorzinho
maneirista, de tons sempre amenos, agora resolveu falar de tortura, em
um contexto que esculhamba os ‘’cruéis ianques’’ e sua suposta sede
imperialista?Será só agora que o puro Botero descobriu que toda guerra é
suja e que nela perversidades são cometidas?Ou será que o latino pintor
que reside justamente em Nova York resolveu tirar uma lasquinha da
ojeriza de todo o mundo em relação aos EUA em benefício da própria
carreira?O que acham, hein?

Ou então vejamos:por que será que o casto Botero
nunca pintou os horrores e atrocidades do regime autocrático de Saddam
Hussein?Ou os horrores cometidos contra os direitos humanos no
Afeganistão antes da invasão americana?Claro que o inocente Botero sabia
de antemão que a esquerda festiva sempre zelou pela soberania dos povos
e de sua independência, ainda que esta independência significasse a
existência de ditaduras e que custasse a vida de milhares de pessoas que
se rebelassem contra estes estados autocráticos.Não, Botero sabe que
pintar o óbvio ululante não dá ibope, ainda mais contrariando os
interesses da esquerda festiva.Botero foi justamente se chocar com as
atrocidades cometidas pelos sempre democratas americanos,que sempre
julgou bonzinhos e acolhedores, como se nunca soubesse do que houve no
Vietnã, como se desconhecesse a inteira história dos Estados unidos,
país- é bom salientar -onde vive.

Nada mais conveniente então que um pintor latino
americano , aos setenta e dois anos de idade, se rebelar contra o
imperialismo americano. Nada mais lucrativo, nada mais rendoso e de
acordo com os discursos políticos que ora grassam por aí.Botero sabe o
que faz.Só não faz arte:faz auto-promoção.

Mas não se enganem.O exemplo da picaretagem de Botero não é único.Ele
é apenas símbolo de um estado de decadência de todos os valores
artísticos em apologia ao discurso vazio do politicamente correto, que
no fundo é o politicamente imbecil e perverso, uma vez que a estupidez
traduz os vícios provenientes da ignorância, da cegueira total das
percepções e do pensamento.Botero não é um artista, é um político sem
escrúpulos que tira proveito do próprio discurso oco.O pior não é ele, o
pior mesmo é a sua platéia.


  

2005-05-17 18:17:00

       
  

Em defesa da vida.E da morte também.

Não consigo entender quem é contra a
eutanásia.Entendo como respeito à vida o direito de fazer com ela o que
se bem entende, inclusive desistir dela, quando não há possibilidade de
continuar vivendo sem dignidade.Certas vidas já são quase póstumas em
determinadas circunstâncias, e a eutanásia então já não se circunscreve à
perda de condições físicas de se continuar vivendo, mas à perda de
condições morais ou afetivas de ainda se viver.A eutanásia aqui ganha o
nome de suicídio. A meu ver, um pleno direito de um indivíduo.

Tendo a respeitar qualquer posicionamento religioso
ou metafísico que defina o valor de uma vida, mas respeito ainda mais as
liberdades individiuais de uma pessoa.A vida de cada um pertence única e
exclusivamente a este cada um.Se alguém acha que a vida é dom divino e
que não nos pertence, então que ele viva de acordo com os pressupostos
que ele definiu para a própria vida, mas que não venha meter o bedelho
na vida alheia e impor seus pressupostos como regras gerais de
comportamento humano.

Eu, cá pra mim, dou um valor relativo às coisas
concretas, que dirá de abstrações etéreas como a vida em si. Abstração
etérea sim senhores.Chega a ser um clichê a falta de sentido que há em
viver.Se nasce, se morre, se ama, se copula e se morre.Tudo isto sem
direção ou definição certa.Claro que havemos por bem inventarmos
sentidos vários em viver, desde os religiosos até os filosóficos.Estas
construções são todas necessárias à sobrevivência, mas acredito que
quando estas construções desabam, nada mais há que se fazer que
tentar descobrir outras estruturas ainda mais etéreas para se
tentar fazer sentido, ainda que seja o sentido da morte, que,
convenhamos, também não faz muito sentido.Trocamos uma falta de sentido
por outra quando morremos.Mas quando não há mais sequer prazer físico em
se continuar vivendo, defendo plenamente o direito da busca de faltas
de sentidos que possam compensar outras, se é que me entendem.E se não
há sequer a possibilidade de escolha, não havendo consciência ou
atividade cerebral, então a coisa se torna redundante:troca-se um estado
de inconsciência por outro.Uma perda pela perda.Um pleonasmo.Com a
vantagem da possibilidade de qualquer surpresa do lado de lá.

Não, não me entendam mal.Não faço aqui nenhum tipo de apologia ao
suicídio(à eutanásia, sim).Até porque não me suicidei, embora tenha lá
meus motivos para o ato.E não, não se assustem de novo, todos temos
razões de sobra para o suicídio.Uns mais, outros menos.Mas sinceramente,
desconfio seriamente de quem nunca na vida pensou em se suicidar.Dar o
devido valor à vida significa antes ter em mente as devidas implicações
do que seria a possibilidade de morrer.Sofisma?Claro que não.Pois se não
sabemos direito sequer as implicações do que é viver, ora esta…

  

2005-05-14 14:42:00

       
  

Um certo andar

Minhas raízes eu prendo ao vento
minhas origens se revelam em sendo
me crio na projeção de um verbo particípio contínuo
em uma constante em busca de sentidos dispersos
 
Deixo ao léu o legado de quem sou ou seria
não há sombra estática que me prenda a mim mesmo
minha alforria é minha morte que me espreita iminente
minha descrição objetiva é o do esboço de meu futuro cadáver
 
Não deixo rastros. Apenas intenções enviesadas
falsas pegadas logo apagadas por recorrentes recontruções
Desbravo o caminho inverso da busca de mim mesmo
qual feto que volta ao aconchego do útero materno
e reencontra o conforto de um nada atávico
 
Nada ainda não foi o que achei.
Permaneço à caça de vazios
que transbordam de quase tudo.
Quase nada foi o que me revelou
todo este processo.
 
Me esforço no não reconhecimento de nomes familiares
que me prendam a uma forçosa e redundante linha reta.
Meu caminho é uma tangente com os olhos virados para cima
Fuga, dirão?Não, apenas um caminhar mais de acordo às circunstâncias
Um desafino descompassado cartesianamenmte calculado.

  

2005-05-10 12:15:00

       
  

The big grandmother

Em novembro do ano passado, escrevi sobre o que
chamam de politicamente correto.Não gosto de bancar o profeta, mas
republico o texto, uma vez que o governo publica agora uma infame
cartilha execrando o uso de expressões públicas que considera
ofensivas, ”politicamente incorretas”.A cartilha  foi feita
com dinheiro público.Segue o texto, publicado originalmente em
23/11/2004, aqui mesmo neste blog:

 

Existe uma nova inquisição pairando no ar.Ela age na surdina,
quietinha, suave como bossa nova, e mais:aparenta ser bem intencionada.É
a indústria do politicamente correto.Os novos inquisidores aprenderam
que na base da porrada não subjugam ninguém e ainda criam movimentos
rebeldes.A nova inquisição tem cara de bonachona, como uma avó
conservadora que vigia todos os passos dos netinhos para que sigam à
risca um manual de bom comportamento.Uma espécie de ‘’big grandmother’’,
uma grande vó ortodoxa agindo na sociedade com um suave jugo para as
ovelhas desgarradas.

Para o politicamente correto, tudo é nuança.Preto não
pode ser chamado de preto, nem aleijado de aleijado.Terminologia direta
é ofensa.Então se procuram eufemismos, semi-tons para raças e defeitos
físicos.Pretos são ‘’afro- alguma coisa’’, gordos são ‘’fortes’’, débeis
mentais sofrem de ‘’disfunção cognitiva’’.É uma revolução que anula
todas as aparentes ofensas(chamar preto de preto é ofensa?) através de
uma nova terminologia.Uma nova civilização que se traduz como um
eufemismo daquilo que é, ou seja, uma suavização do que está na nossa
frente(?).

Mas o politicamente correto não age apenas no campo
verbal.Ele faz uma reestruturação do comportamento humano.É proibido,
segundo suas bases, não ler qualquer livro até o fim, bem como é pecado
mortal julgar qualquer obra sem terminá-la.É proibido ofender algo ou
alguém sem que se esteja plenamente certo da mediocridade ou
desonestidade do dito cujo.Para o politicamente correto, Paulo Maluf é
um político ético e Paulo Coelho, um bom escritor, até que se prove o
contrário.A dedução, o instinto, a intuição mais óbvia são
terminantemente proibidos segundo os pressupostos politicamente
corretos, e quem desobedecer as regras, queimará na fogueira do opróbrio
dos julgamentos precipitados e injustos.

Esta nova sociedade que emerge garante liberdades
fundamentais que nunca sonharam ser conquistadas:o medíocre tem direito
de ser medíocre, o aleijado tem direito de ser aleijado, e o
negro(pasmem!) tem direito de ser negro, mas não nestes termos
verbais.Não é mesmo uma revolução?

Poderia se perguntar qual o sentido desta nova
inquisição:diminuir os preconceitos?Ah sim, porque a palavra
fundamental, o índex paradoxalmente usado ad nauseum pelos politicamente
corretos é ‘’preconceito’’.Como tudo é eufemizado neste universo
particular, então os conceitos deixam de existir, claro.Tudo torna-se
manifestação subjetiva e precipitada. Tudo é pressuposto, um idiota não é
idiota e um cego não é cego, até que se prove o contrário.Como já
disse, tudo vira nuança, posto que conceitos absolutos se tornam ofensas
gravíssimas.Afinal de contas, dizer que um surdo-mudo é mudo é um
desaforo, não?

A revolução do politicamente correto é a revolução da perda de
identidade.Como todos os conceitos absolutos se transformam
em ‘’pré-conceitos’’, todos se ofendem por serem chamados do que
são.Todos perdem suas definições elementares e se tranformam numa
gigantesca, plácida e feliz massa amorfa, em que ninguém sabe o que é e
ninguém define o que vê.Uma pedra seria uma pedra, uma mulher seria uma
mulher?Não, claro que não, todas estas >
  

2005-05-07 13:30:00

       
  

Meu avô morto

Meu avô morto me fitava de olhos fechados
me olhava sem olhos mais fundo que os vivos
com a calma indiferença dos mortos
contemplava sereno meus olhos secos
sem emoções efusivas sem arroubos
 
Seu desaparacimento me lembrava minhas ausências afetivas
contrapeso de perdas futuras postumamente antecipadas
seu corpo imóvel coroava de gravidade muda e tátil
o balé de movimentos esquálidos em seu redor
(extrema unção de vivos em descompasso)
 
Sua morte me lembrava
a origem futura de meu primeiro não
do meu primeiro aceno negado
do meu primeiro nada como resposta
 
Do alto de seu trono magno o esquife involuntário
meu avô pagava com redobrada crueza
cada riso zombeteiro de adolescência soberba
cada movimento brusco do meu ego incipiente
 
Meu avô morto estirado no caixão
me arrancava dos saltos da minha infância
me colocava em meu devido lugar
mais baixo que o chão que amparava seu corpo
mais baixo que a cova que o abrigaria
em seu repouso ofensivo à minha permanência
 
Meu avô morto me ensinou a excelência eterna dos mortos
e a esqualidez perene e precária dos vivos
 
A dor de sua perda não é tanta pela falta que me faz
mas pela presença muda de sua voz silenciosa
que desorienta meus descaminhos
que cobre de véu um enigma já indecifrado
 
A perda de meu avô é antes
o ganho de um vazio materializado
como cova sem caixão
(buraco inútil)
como um corpo sem vida
(buraco tácito)
como um gesto de recusa
tardiamente descoberto
(abismo pleno).
 

  

2005-05-04 11:00:00

       
  

De direita

Da série ‘’soluções simples para problemas
complexos’’.Seguinte: tenho a cura básica e definitiva para a questão da
violência no Brasil, em especial nas grandes metrópoles.Tolerância zero
ou, em outras palavras, política de segurança pública de direita.De
direita mesmo.Cuspiu na rua, vai preso.A tese de que pequenos delitos
levam a outros de maior gravidade é a mais correta que já ouvi.Simples
psicologia social.E não é nova.Resolveu o problema da violência urbana
em Nova York e alavancou a popularidade do ex-prefeito Giuliani.É uma
política truculenta? É. Mas resolve.Há a possibilidade de que se cometa
injustiças? Há. Mas me digam qual política de segurança pública, ou
melhor, qual política de qualquer espécie que não esteja sujeita a
injustiças.A questão é a devida dosagem e a competente aplicação da lei.

No Brasil, claro que sempre haverá resistências a
este tipo de conduta.Sempre há a conversa mole de um trauma sofrido
pelos anos de chumbo da ditadura.Qualquer método menos sutil de combate
ao crime é visto como uma violência aos direitos humanos do
cidadão.Entenderam bem?Violência abstrata contra os direitos do cidadão
não pode;já com assalto a mão armada, sequestro, estupro e subgêneros
pode haver uma certa tolerância.Estas inversões patológicas só podem
acontecer em um país onde impera a bobagem. Pessoas com nobilíssimas
intenções saem às ruas vestidas de branco com bandeiras pedindo
paz.Pedindo paz a quem , cara pálida?Ao Fernandinho beira mar e seus
asseclas e comparsas?Uma tentativa de comoção nacional da
bandidagem?Bandeira branca , em uma situação de guerra(contra o crime,
no caso), tem uma outra denotação, a da capitulação, de rendição
imediata.Imagino um traficante desdentado com uma escopeta nas mãos
rindo das ofensivas verborrágicas de sociólogos a artistas pacifistas
pedindo paz e harmonia para a humanidade.

Minhas castas e bem intencionadas criaturas, não se
combate o crime com boas intenções, amor e harmonia.Sim, sim, Jesus
Cristo fez isto, purgou a humanidade de seus pecados, dando a outra face
ao agressor, mas do ponto de vista prático, o que aconteceu foi
que o homem foi torturado e crucificado até a morte.Não acredito que
ninguém esteja disposto a tal sacrifício em nome da humanidade, muito de
menos de ‘’dar a outra face’’ quando está sendo
estuprado(imaginem…).Violência urbana se combate com o uso racional e
organizado de repressão à violência;com o uso mesmo de violência
racionalizada(se preciso for) contra a violência desmedida de
criminosos.Isto implica, se necessário, o uso das forças armadas e o que
mais se necessitar.Mas não, as pobres vítimas simbólicas da ditadura e
membros da esquerda festiva sentem engulhos quando vêem soldados de
fuzil na mão nas ruas.Preferem, claro, ser roubados e assassinados;
preferem ser vitimizados por delinquentes que, afinal de contas, são
também vítimas de uma perversa exclusão social…

Eu, cá para mim, prefiro minha solução direitista,
anti-pacifista de combate ao crime.Chutou cachorro na rua, vai
preso.Pichou o muro, vai preso.Passou a mão no traseiro da opulenta sem a
devida autorização, vai preso.Noções básicas de civilização são as
primeiras leis que inibem qualquer tipo de crime.Destas pequenas coisas
até a presença das forças armadas, se necessário , como é necessário no
Rio de Janeiro, por exemplo.Lá, os novos membros da esquerda festiva
compram maconha na rocinha e fumam em plena praia.Tudo isto, claro, em
nome da rebeldia contra a ordem estabelecida e a favor dos arrastões,
das legítimas sublevações da massa popular contra a burguesia.A polícia,
claro, assiste de braços cruzados estes movimentos rebeldes que
redundam na mesma imbecilidade coletiva.

Em tempo:nada contra ou a favor a maconha, que,para mim, não fede nem
cheira(aliás, fede sim).Mas tudo contra uma determinada rebeldia
estúpida e infantil, típica de adolescente de nariz empinado com trinta e
sete espinhas na cara e nenhum miolo na cabeça.Ah , e aqui não falo
apenas dos maconheiros da orla marítima do Rio.Falo de todos os gentis
cidadãos da terrinha.Uma metáfora tupiniquim mais que elementar.