2005-10-09 03:50:00

       
  

A voz do diabo

O mal do diabo é que ele é incapaz
de amar.Não consegue gostar de ninguém.Nem um tiquinho que seja.Sua
incapacidade de sentir algo por alguém é que o torna presa de sua
própria crueldade.Em suma, pode-se depreender desta lenda que a origem
de todo o mal é a ignorância.Quer seja ela sentimental, moral,
intelectual ou ética.Através da ignorância,uma pessoa está sujeita a
se tornar um espírito de porco, quase tão feio quanto o diabo.

A personificação individual do capeta já é
malcheirosa, que dirá de um povo inteiro.E bem sabemos(ao menos eu sei)
que toda aglomeração cheira à mediocridade, condomínio preferencial
do cramulhão.Por isto meu medo de decisões populares.Não, não é nada
contra a democracia, dos males o menor, como já dizia Churchill.Mas
creio que votações em membros de executivo e legislativo já são mais que
suficientes para suprir meu desejo de consulta popular.Referendos para
este ou aquele outro tema em particular sempre me cheiram à enxofre
populista:o mal personificado de uns tantos políticos sapientes em sua
ignorância moral calculada somado à burrice endêmica e coletiva do
populacho.Desde quando cidadãos comuns são aptos a decidirem se comércio
de armas deve ou não ser proibido?Desde quando pessoas comuns e em
sua maioria mal  informadas são aptas a decidirem pela
liberação ou não de drogas ou qualquer outra coisa do tipo? Certas
decisões devem se circunscrever a alguns especialistas e jamais serem
mote de voto popular.Já imaginaram se submetem todas as decisões
políticas ao público? Não haveria reforma previdenciária, a jornada de
trabalho seria de duas horas mensais e o país(qualquer país) iria à
bancarrota.Isto só para ficar em dois exemplinhos de ordem
econômica.Desnecessário dizer que em um país como o Brasil, com oitenta
por cento de analfabetos funcionais, a coisa se complicaria ainda
mais.Desnecessário, mas digo assim mesmo, só para lembrar.

Não adianta, Voltaire estava mesmo certo:o povo
precisa de uma canga.Mesmo em países mais civilizados, a constante de
uma população é o senso comum, que é meio caminho andado para a
mediocridadae, para o mal, pai e mãe de todas as formas de ignorância,e
filha desta mesma união incestuosa.Tomem a Alemanha, país cujo histórico
de filosofia e música é superior a todos os demais.Pois bem, qual o
maior legado histórico da Alemanha no século vinte?O nazismo.Culpa de
quem? Do povão, que aplaudiu Hitler e seus asseclas.

Ah sim, sim, o nazismo foi autocrático, mas justamente porque o povo
quis assim.Eles que escolheram a canga errada, ora pois.Há que se ter um
mínimo de bom senso(bom senso, não senso comum) e regra para escolher a
canga certa.Por isto a idéia- se não genial, paliativa- de democracia
representativa, em que votamos em quem nos irá guiar.A idéia
de chefia de estado não é agradável, eu sei, mas esta é
necessária justamente à manutenção de uma certa liberdade consentida,
uma vez que liberdade escancarada se transforma em avacalhação, para
conceituar eufemisticamente. E há que se escolher estes chefes
de estado,, há que se formatar o estado em si, ainda que
seja através de um voto por aproximação
instintiva.Basicamente, há que se escolher o governo, cujos assessores,
ministros e técnicos farão algumas escolhas mais acertadas por
nós, sobre assuntos os quais não somos suficientemente informados.A
possibilidade de erro ao votar em um comando de estado é
enorme, e erramos continuamente, mas pelo menos não corremos o risco de
sermos diretamente governados pelo povão, ou pelo diabo, como
preferirem, através de referendos ou quaisquer outros instrumentos de
absoluta e nefasta soberania popular.

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