2006-01-26 16:40:00

       
  

No soy loco por ti, America

Latino americanos reclamam sempre
dos estereótipos que o primeiro mundo lhes inflinge.Mas a nhaca é que
quase sempre o estereótipo cabe perfeitamente.Estereótipo vendido, ou
melhor dizendo, dado de graça ao resto do mundo.

A América Latina é o paraíso do populismo.Tem para
todos os gostos e vêm em todos os matizes e formas.Agora mesmo, por
exemplo, se instituiu o populismo racial, nascido da eleição de Evo
Morales na Bolívia.Troncudo e carrancudo, Morales, como o nosso Lula,
não tem plano de governo, é desarticulado e propagandeia uma política
estatizante, ‘’contra lo imperialismo’’, mas é uma belezura de ícone,
pois é índio.Bem,dizem as más línguas que é mestiço, como noventa por
cento dos latino-americanos.Mas que importa?Se o homem parece índio, é o
que vale, não? Com esta superioridade étnica, que importância faz ou
não um plano de governo?

No Chile a também recém eleita Michele bachelet bateu
o pezinho e proclamou que metade de seu ministério será composto por
mulheres.Resta saber se o quesito ‘’competência’’ estaria mais ou menos
emparelhado com o populismo de gênero sexual da senhora em questão.

Mesmo na Argentina, o discreto Néstor Kirschner não
faz frente ao maior ativista político de país:Diego Armando Maradona.Com
o exemplar quociente intelectual de um jogador de futebol, diegiuito
brinca de embaixada com Fidel Castro e faz par romântico com seu ídolo
maior, o presidente da Venezuela, o célebre Hugo Chávez.O romantismo
aqui diz respeito àquela utopia ideológica Bolivariana, de conquista de
liberdades do povo latino americano-liberdade a toque de golpe militar,
diga-se.Porque los latinos são muito viris, por supuesto. dieguito
acompanhou recentemente seu ídolo Chávez em um comício contra a Alca,
contra os EUA, contra Bush, contra o imperalismo e contra sei lá mais o
que, em que Hugo dava saltinhos e dizia palavras de baixo calão em
ofensa aos imperalistas.Tudo muito romântico mas tudo muito viril,
claro.No melhor estilo do populismo militar e revolucionário.

Resta, entre tantos outros exemplos do salutar
populismo latino americano, o nosso Lula, profundo admirador de todos
estes aqui mencionados.Lula não é índio, não foi militar, não joga
futebol(ou joga mal), não é mulher.Mas foi pobre, virtude mais que
divina dentre todas as escalas do populismo.Lula é o epítome sorridente
do populismo social.Disse recentemente que não tem cara de zona sul
carioca, que prefere a periferia.Deve ter dito entre um trago ou outro
de um charuto cubano ou um gole de Romanée-conti, seu vinho
favorito(5000 dólares a garrafa), a bordo de seu aerolula.Mas claro:suas
raízes sócio-político-culturais, e diria até intelectuais, estão no
gosto peculiar pelo frango com polenta acompanhado por uma cachacinha.

E assim vai se construindo o famigerado preconceito-ou seria conceito mesmo?- do que seria o perfeito idiota latino americano.

2006-01-20 21:19:00

       
  

Território

Meu corpo minha pátria
solo infértil de incerteza
chão oblíquo
onde repousam meus cansaços
 
estrangeiro de mim mesmo
exilado de minhas raízes
busco tatear minha sombra
busco na projeção de minha matéria duvidosa
o contorno de minhas fronteiras movediças
o traço involuntariamente imposto(nem tanto)
do meu estado soberano democracia estilhaçada
por vontades desejos convicções fragmentadas
desconjuntura coesa conquistada por avessos e preguiça
 
o consolo da chegada antes da partida
idéia alentadora de terras países continentes a desbravar
mas a lembrança imemorial de um meridiano circular
 
o país é o mesmo
a terra a mesma
o universo o mesmo
as diferenças as mesmas
o infinito sempre o mesmo
 
E contemplo meus pés quase entediado.
 

2006-01-16 13:29:00

       
  

Loiritude paquistanesa

Na Índia, a onda agora é
branqueamento de pele para se moldar ao padrão de beleza
nórdico-ocidental.Vem aí um exército de Michael Jacksons veneradores de
vacas?Sabe-se lá.Mas cale-te boca que em matéria de esquisitices de
personalidade, o Brasil ganha de longe de todo mundo.Aqui, algumas
moçoilas pintam o cabelo de louro- platinado-amaralo-manga e esturricam
ao sol que nem misto quente.Mulatas suecas nas parágens tupiniquins. Por
aqui,até os critérios de subjugação racial são subvertidos.Mais
estrambótico que romance de Garcia Márquez.Aliás, quem precisa de
realismo mágico com um país assim?

Mas o negócio é o seguinte:além das questões
sociológicas de dominação sócio-etno-econômica e outros blábláblás, o
fato é que todo mundo mais cedo ou mais tarde enjoa de si mesmo.Uns com
mais , outros com menos frequência.A mudança na cara, na pele, no
cabelo, no dedão do pé é apenas uma manifestação exterior de um enfado
geral consigo mesmo.Nada de mal nisto.Melhor que narcisismo patológico
que invariavelmente em escala coletiva recai sempre no mais hediondo dos
disfarces do mau caratismo, o famigerado patriotismo.E, ora, ninguém
melhor para odiar a si mesmo com devida acuidade que o brasileiro.Odeia
seus políticos, suas origens, sua cultura e tenta de toda maneira se
desvincular de sua imagem.Os mais medíocres fazem o trabalho de
descaracterizar a própria cultura, como por exemplo distorcendo
o samba, a música sertaneja e outros estilos botando tudo num saco
pasteurizado em que se cria uma espécie de bolerão de cais de porto,
para usar uma expressão de Julio Medaglia.Os mais refinados( e
endinheirados) saem do país e dão uma banana para o bananão, como
fez Ivan Lessa.Os que ficam falam mal da própria terra em ritmo de
catarse libertadora(sim , o meu grupinho) ou pintam o cabelo de laranja e
vão tomar sol em Ubatuba até ficarem azuis.

Sim, sim, as perspectivas dos remanescentes não são
muito boas, mas as dos fujões também não são.Senão vejam o exemplo do
próprio Ivan lessa que não pisa em solo tupiniquim há trinta anos.Lessa
claramente tem pavor do Brasil, mas sabe que o país está entranhado em
cada póro seu, apesar de viver em solo britânico.Tenta ser
pedante,blasé,sofisticado, culto, engraçado(e o consegue)mas só o faz em
português, língua pela qual tira seu sustento.Não adianta, não se exila
de si mesmo.Seus trejeitos, humor e maneirismos são os mesmos dos quais
ele debocha:tipicamente brasileiros.Enfim, um caso clássico de amor e
ódio a si mesmo.

Nada contra, nada contra.Muito pelo contrário.A maior virtude
brasileira é esta mesma ambiguidade fruto do próprio auto
desconhecimento somado a doses de  esquizofrenia social, política,
artística, étnica e cultural.Um não-sei-que que impede nosso avanço
econômico mas contribui para a melíflua, lúdica e epopéica falta de
caráter tupiniquim.Com as devidas madeixas aparentemente louras
sobre a pele emplastrada de bronzeador.

2006-01-11 03:04:00

       
  

Restos constrangedores

Mudar de idéia é recorrente numa
vida.Mas vez por outra quando a idéia tenha sido motivo de paixão
ardorosa, o negócio da mudança fica doloroso.Como deixar de amar uma
pessoa, descobrindo que a dita cuja é mau caráter, perniciosa e
canalha.O desencanto é lógico, mas sempre fica uma mágoa que se traduz
em uma certa utopia de talvez não se estar certo o suficiente sobre o
caráter da outrora bem amada e também sobre seus próprios sentimentos
atuais em relação à ela.Enfim, o mesmo se dá com crenças
abandonadas, aquelas estruturas ideológicas que comandavam nossa
vida e que de repente desmontam ao vento.Como perder o chão e ser
obrigado a trocá-lo por outro(que geralmente é tão ou mais movediço que o
último).

Assim em tudo, desde convicções políticas a aspectos
mais religiosos ou éticos.Sempre fica um resíduo daquilo que você
abandona no meio do caminho.Tal qual o ex-católico agora ateu que
se benze ou reza quando ninguém está vendo e o faz por um medo
atávico remanescente da infância(ai,ai, Freud…) quando os cânones
cristãos assimilados eram expessão absoluta da verdade;tal
qual um ex-comunista que depois de toda a história do stalinismo e
da derrocada do famigerado sistema ainda afirma que o
mesmo comunismo sobrevive enquanto sonho de um mundo melhor;como
quando um petista frustrado ou envergonhado diz que votaria na reeleição
de Lula ou nulo ‘’porque, ah, são todos iguais’’.

Não se sai ileso de uma crença que um dia foi
absoluta.E mais grave: de uma maneira geral,a besteira, a
ignorância e a cegueira sempre deixam rastros indeléveis na psique
humana, ao contrário da inteligência, que se esvai ao menor sopro de
alento mistificador.Talvez porque a inteligência pressuponha um certo
ceticismo elementar, um certo desprendimento de convicções e um certo ar
enjoadinho meio metafísico meio blasé que não é afeito aos
temperamentos mais contentes e felizes.Pensar dói um bocadinho e o torna
meio apartado de certezas absolutas, coisa que não leva necessariamente
a uma vida particularmente esquemática e colorida.Por isto a tendência
geral é se aferrar a estruturas mais fáceis, mais elementares que possam
moldar um grau de adaptação afável às circunstâncias adversas.

E o pior é que em nosso mundinho medíocre, o
pobre sujeito que , com toda honestidade intelectual e moral, muda de
idéia, assume que errou, é taxado de vira-folha.Enquanto a mula de
pensamento único do tipo Luis Carlos Prestes é premiada com o
título de ‘’coerente’’.

Há, claro, que se tentar acreditar em uma ou outra
coisa para pelo menos fingir(para si mesmo também) uma certa
estabilidade moral e intelectual e, convenhamos, alguns princípios
éticos são universais mesmo, embora os antropólogos multiculturais
barbudinhos de rabo de cavalo digam o contrário.Mas ainda assim,
meu caro leitor, quando abraçar uma idéia, abrace devagarinho, com
sutileza,sem ‘’idealizar a idéia’’, capisce? Sem muito radicalismo,
antes que ela, a infame idéia crave os dentes em você como uma daquelas
vamps que usam botas de couro com salto quinze.E então, meu caro
desavisado, você poderá correr o risco de se deslumbrar, de se apaixonar
por uma megera vulgar e sair por aí dizendo que a fulana é casta,
elegante e imaculada.Depois para voltar atrás, já viu…