Sem musa
Canto em silêncio o que não sei cantar
Canto o voo sem asas do sobrepeso do nada
a incensar o berro incontido da impossibilidade
Canto aquém de mim
o que poderia ser
a música insciente
do que me supera e me atravessa
o som dos ouvidos surdos
que aplaudem meu fim
Canto por fim o princípio do cantar
que é dizer ao léu
gradiloquentemente
a mudez da sobrevida
à luta perdida
que se ganha porém à margem do eco
destoada do coro consonante
da profissão de vozes uniformes
Canto o amador que ama torto
o canto trespassado pelas vaias do mérito
Canto o improviso sublime
do ensaio do despreparo.