O passado

Te alegras em reconstruir o passado
à imagem e semelhança
da utopia póstuma
que não vingou

Te vingas do erro consumado
consumando o erro acertado
do imaginado

Porém
nenhuma ação perdoa o imaginado

Mas que pode o ato contra
a intenção que semeia o pós – fato?

Te alegras em conduzir o passado
à imagem futura
da utopia viva
que ainda e sempre
se adiou.

Um rosto

Um rosto nunca se dá a sorte
de seu fundo conhecer.
Como a vida,
à semelhança da morte
que se cria
sem a si se conhecer.
Talvez o fundo
na superfície se escorra.
Por certo o mundo
de seu criar-se se corra.
Pele, terra e céu revestem
a visão
do que nunca se vê.
No que não se toca
também se sente
no que se mostra
também se mente.
Pele, terra e céu travestem
o ideal que sempre se crê.
Um fundo
só se dá a sorte
de seu rosto conhecer
que lhe encara – cego
travestindo a morte
certo
de jamais se perceber.

Hipótese

Eu não
Não farei, não direi
Ou talvez fizesse
se me quisesse ator
do que não sei
Ou talvez dissesse
se soubesse
o enredo
em que me enganei
Me entrego ao erro acertado
onde não me sei
Sim, eu me doei
Onde pulsava
farsesca vitória
eu me matei
Onde cursava
o fim da derrota
eu me entreguei
Sim, me arrependo
do que sei
porque saber
é provar o gosto
do afeto inventado
que me dei.