Ela age pela forma de sua ausência,
alterando os rumos do que não conduz,
sem deixar rastros de sua rota miserável.
Ela espelha a falta de seu reflexo,
como vampiro irrefletido,
sugando a doação
que se nega.
Por assepsia dos fatos,
por vezes é premiada
como virtude viciada
porque nunca erra
pela não tentativa.
Ela é a mãe desnaturada
que acaricia a sombra do filho
nunca nascido –
que chora sem lágrimas
a realização de toda promessa
de tudo mais que poderia ser
por menos que o nada
que paralisa toda intenção de afeto.
Um único, simples gesto a mataria,
para que tudo pudesse viver
e no entanto sua morte é tão viva.
Bula
Cura fast food para depressão:
dinheiro, sexo, desejo fabricado
por anestesia voluntária
de sua origem não verificada,
ação espasmódica contra o vento.
Efeito colateral não imediato, lânguido e pastoso:
mediocridade, vazio, contentamento esterilizado,
intenção mediada pelo vento.
Placebo para criação de uma doença invisível:
amor inventado, ideologia limitada,
indignação obstinada contra o vento.
Doença redentora indicada para cura irremediável:
amor inventado consciente de sua invenção necessária;
pensamento caótico que destrincha
devora e defeca sua incerteza
com fé nos dejetos sólidos da sombra
de uma tentativa de verdade;
epifania cega que se toca;
suicídio sempre iminente
vivo e pulsante
no olho do furacão
que rodopia a criação
da queda do fim inexistente.
União
Uma lírica mentira salva
da fresta de verdade
– que por se arrogar inteira
não enxerga o muro
que a contorna
Uma lírica mentira
que abraça
uma verdade incompleta
noivam
e criam a porta
no muro que inventam
e se casam
no desmoronamento
que atravessa
sua passagem.