Não há culpa no vírus mortal
que se alimenta de morte
para assegurar sua vida
tampouco há culpa
na rosa e seu espinho
que ferem a mão
que viola sua beleza
tampouco há culpa no desvio do olhar
do teu grande amor que o ignora
tampouco há culpa
no reçém nascido
que – pelo desconforto de nascer –
chora.
A culpa é uma excrescência
da consciência que a alimenta.
Não há tragédia maior
para a excrescência da consciência
que não enxergar culpa
e não se culpar pela cegueira
e apontar a esmo ou a cálculo
o culpado por tua desgraça.
Culpado é aquele que não enxerga
a própria graça:
a graça do sangue
que banha o encanto da flor
cuja beleza se implora ;
a graça do amor que jorra
e lava a indiferença
que o ignora ;
a graça do vírus
que o conduz
a uma aprendizagem sobre a morte
ou a outra vida afora ;
a graça da criança
que pelo teu afeto e atenção –
chora.