Receita de preguiça virtuosa
Carrego comigo laboriosa preguiça
viciosa virtude insciente que me salva
de outros vícios capitais
Por me enganar em nada fazer
tudo ganho em nada perder
Mas há que se trabalhar o engano
Preguiça desmazelada
a de descansar os cansaços
de tudo querer:
um homem perde-se
na acídia de se ausentar
de sua criação fabricada
Perde-se a fábrica mesma
de uma intuição verdadeira
no árduo trabalho
de sua invenção
No vácuo materializado
da laboriosa preguiça,
construo o fingimento
que me invento, quando,
mesmo inerte, sou inventado,
cientemente preguiçoso
do mamolengo da sorte que me move
e, preguiçosamente, me deixo encenar
por todos os falsos apetites
que me consomem
-enquanto os devoro
com minha insípida indiferença calculada.