Os apetites de Janaína
Janaína devorava sentimentos líricos com alcaparras
e cuspia fora sementes de mágoas alheias
De sobremesa as entranhas de seus cadáveres ainda frescos
Adocicava-os a ponto de quase ressuscitarem
ao sabor agridoce de suas presas
Janaína crudelíssima comia sonhos estéreis de rapazes utópicos
deglutia estruturas planas de relacionamentos estreitos
mastigava pausadamente convicções severas e objetivos claros
Janaína se deleitava lambendo os ossos
de seus pretensos algozes, sutis novilhas já no forno
com olhos revirados e nobres intenções no sal
Doce, levemente apimentada a lembrança de janaína…
Saudades de seu apetite cego e voraz
Saudades de ser destrinchado
pela sua ausência de modos à mesa
Ah, o prazer tátil de ser devorado por Janaína…
Nem se preocupava em nosso cozimento, a Gourmet
Comia-nos crus, com olhos, mãos, dentes e corpo inteiro
Já nem nos lembrávamos de nosso espectro
enquanto iguarias prestes a sermos experimentadas
Éramos complacentes o alimento que nutria
os desejos especialíssimos de Janaína
que nem engordava, autofágica que também era, coitada.