A cada dia o sol se levanta
e cumpre sua função
sem nada saber da intenção
que o abriga.
A cada instante uma mosca
gira em torno da luz
sem saber da iminente
morte que a habita.
Um leão mata um cervo
para saciar a fome de sua natureza
sem laivos de crueldade:
cumpre sua função
na cadeia natural
que o limita.
Só você, bicho estranho
se alimenta da incerteza
da razão de se levantar
para um novo dia
que gira em torno da morte
que o incita à vida
que mata seu desejo de matar
em nome da cadeia da razão
que o liberta e tramita
pelas leis colocadas
pela criação e superação
da tua natureza volátil,
avessa tantas vezes
à tua vontade
que nunca obedece
a um desejo tão confundido
quase desaparecido
na sua recorrente recriação.
Só você, bicho estranho
habita a cadeia desnaturada
que cria sua liberdade de ação
para além da prisão
da sua desnatureza inventada.
Só você, cruel, bom, generoso
nos equívocos de tua boa ação,
impõe sua dúvida como método
e segue em frente por não saber o porquê.
Só você, sol da sua fome
mosca e leão
que se come a cada dia
em torno do buraco escuro
que a ilumina e desabriga.