Sintoma

Padeço agora da falta urgente de sintomas.
Alguma doença há de me resgatar
desta saúde estéril que me joga
no mais vaidoso tédio de apenas
sobreviver .

Narciso nunca viveu. Espreitando lambendo
a própria imagem intocável , vivia estático, saudável,
à sombra de toda existência fora de si:
suicidava-se vivo continuamente
em glória à própria vida que jamais concebeu .

Todo outro , toda voz de um outro , toda tentativa falha de comunicação de comunhão
impossível com outra pessoa
é sintoma
de querer estar vivo.

A cada fracasso a cada ruído
em nossas vozes
misturadas que não se ouvem
ironizamos a falta de sentido.
Mas criamos um sentido que preenche a nossa falta.

Nunca saímos de nós mesmos
Mas tateamos no quarto escuro
de nosso isolamento
a sombra de algum toque furioso
que nos infecte de algum alegre desespero
e nos faça mergulhar para além
do suicídio vivo de nossa própria e covarde companhia .

Estamos sós . Sempre . Mas entrelaçados
em bilhões de outras solidões que nos sopram
e viralizam sua misericordiosa angústia .

Jamais Fechar olhos mãos corpo a todo sintoma
que nos move .
Um órgão só se sabe vivo quando dói.
Alguém só se aprende vivo quando aprende
um sentido pelo qual morrer .

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