Adrilles Jorge

Não há amor puro. Todo amor é sintoma . Quanto de amor real há no seu amor ? Quanto de carência , vaidade de posse , imitação de desejo coletivo há no teu amor ? Quanto de desejo puro há no que você quer
que não seja imitação
do teu meio que te ensinou a desejar ?
Quanto do teu meio te ensinou a se orgulhar do que desejar , se envaidecer do que amar ?
Quanto do teu trauma te empurrou a desejar , a amar o que te faz desabar ?
Quanto de suborno há no ato de caridade ou justiça com que você doa se candidatando ao cargo público ou lugar privado no céu ?

Nada há de puro na origem ou intenção do que se quer , faz , ou ama .

Só a ação repousa no mérito para além da intenção .

Aja . Ame, doe agindo
ainda que interpretando
o amor incerto que você tem .
Receba o amor interpretado e incerto Finja agir e ser acionado por amores impuros
que a ação pura do amor vem .

Fabrica – se uma pessoa ideal por esboços lógicos de alguém real :
a precisa envergadura das coxas
a imprecisa e vasta largura da alma
os olhos que enxergam
a curva da palavra que se espera
as canções que escutam
o som das diferenças
que se abraçam
os filmes que projetam
os finais felizes
que principiam nosso eterno recomeço

Fabrica – se uma expectativa
da resposta que não vem
que ensurdece e desafina
a canção
que interrompe o filme
no meio da história que não fecha
em um final que nunca chega
na mensagem que nunca chega
na palavra que nunca chega
no começo que nunca vem .

Fabrica – se um outro ator
uma figuração que toma
o teu palco e te torna coadjuvante
da intérprete do filme
que não é mais teu
do filme que você não mais dirige
da canção que um outro canta
na voz e na boca que você imaginava
ser tua .

Fabrica – se você agora
atuando como um personagem
de realidade paralela
onde teu sonho
esbarra numa realidade
imprecisa
de uma pessoa ideal
por esboços lógicos
de alguém real .

Fabrica – se agora a espera
por alguém por uma realidade
que você ficou
que você beijou
como na boca da esperança
que respira pela tua
que te mata
a cada sopro de espera
que te ressuscita.

Não te conheco a fundo
Sequer me conheço a fundo
Não conheço a fundo
o que me faz idealizar você .
O ideal humano
que persigo conheço
em profundidade
mas não os métodos de ação
ou história das ações
Não conheço a fundo as intenções
de quem viveu ideais destroçados
ou de historiadores que escondem
suas intenções ao idealizar
suas histórias .
A vida ou alguém se conhece
em superfície .
A superfície
vem à tona , seus atos
espelham na superfície
um vago fundo de suas intenções
nunca conhecidas .
Ama – se odeia – se uma superfície
que traduz uma ação .
Por este truque de autoengano
chega – se a tocar o fundo
de se amar alguém ou algo
sem jamais conhecê-lo .
O fundo é a superfície onde
toco teu corpo
teu movimento
superfície onde toco tua ação
onde nos tocamos sem nunca
nos conhecermos a fundo
Superfície
que traz à tona a sombra iluminada
da invenção do que se ama
a invenção de quem se ama .

Há sempre uma espera
por uma pessoa que ainda não veio
ou pela ação da pessoa que veio
Espera pela tua ação certa
para melhorar a pessoa que veio
Espera pela libertação
do que te aprisiona :
O trabalho certo a pessoa certa
Que você esperou e veio
mas não à sua maneira
Há a espera que o país melhore
que tua família melhore
espera que tua vida melhore
pela ação que você faz pelo país
pela família
pelo trabalho ou pessoa incertos
que você tenta acertar
por tua ação
que você tenta acertar
pelos erros inesperados
que moldam o amadurecimento
da tua espera .
Há a espera pelo filho
que você espera
o trabalho certo
a pessoa certa
para ter .
há o filho que veio
com a pessoa incerta
com o trabalho incerto
que você espera acertar
com a educação
que lapidará melhor
as esperas dele ,
Tua maior esperança
Há a espera negada pela morte
que é o descanso de todas as esperas
Há a espera da memória
da tua ação que justifique
todas as suas esperas
Há a espera
pela eternidade após a morte
que é o desespero
do fim de todas as esperas
onde mortalmente feliz em todo além
você angustiantemente
não tem nada mais a esperar
a não ser contemplar o eterno presente que nos escapa
no segundo em que você lê
este poema .

A primeira das últimas vezes
A primeira das últimas chances
a gente não esquece :
o primeira e derradeira promessa
a primeira desilusão que pavimenta
um buraco no destino .
A fidelidade a um futuro
projetado
que te trai .
Outras tantas
Últimas vezes se sucedem
e pavimentam um caminho
de tantos nunca mais
tantos caminhos maduros
que apodrecem para
além de sua calma estação .
O Velho clichê : foco no trabalho .
Mas não há outro trabalho
que não seja a construção
de elos afetivos com quem importa.
Todo trabalho
é caminho para um outro.
Um pedreiro
faz uma casa pra um outro . Um engenheiro constrói estrada
para um outro .
Construir casa e caminho .
Construir o outro no desejo
trabalhado na casa e no caminho
certo é tão mais trabalhoso .
Tantas últimas vezes
em que a estrada tão meticulosamente pavimentada
vai dar na casa habitada
por um sonho inóspito
que te expulsa de tua
Reiterada última tentativa .
Últimas vezes se repetem
e não se aprendem quando
se desorientam . Já nem se sabem
porque começaram
Já nem se lembram
de por que começaram
e tentam outra e outra vez
sabendo que no fundo
jamais serão últimas :
renascem nos olhos
do adolescente
como da primeira vez
que nada sabia
do primeiro caminho
da primeira casa
da primeira queda
da qual se levanta
nunca pela última vez

Do teu ventre
eu nunca inteiramente saí
. As dores do nosso nascimento
e crescimento
se comunicam
na alegria de um parto permanente .
Em mim , nasce você como mãe .
De você eu nunca inteiramente parti.
Nasço eternamente de ti .
Mãe e filho eternamente concebidos.
Desde dentro e fora do teu ventre
te ensino e concebo ,
frágil e engatinhando
o amor de mãe
em que nasces em mim
também a cada dia .
Aprendo a andar
para caminhar longe de você
fora de você mas em direção
ao mundo que é o útero
onde moramos um no outro .
Em cada ausência em cada fome
em cada ausência que nasce
como uma morte provisória
em cada negativa de um desejo frustrado renasce a cada instante
a vida lapidada onde nos educamos
no parto eterno onde nascemos .
Do teu seio alimentaste
-do meu desamparo –
teu nascimento
como mãe .
Do teu leite
jorra cada doação
a cada pessoa
em que te reconheço
como mãe .

Morre em vida
uma flor
a cada olhar
que por ela passa os olhos
sem a ver

Estão mortos os olhos
que não sabem ver uma flor

Morre a flor
por não saber enxergar
os olhos que de longe
tímidos a souberam ver
como ninguém

Ressuscitam em alguma parte
olhos que florescem
em busca de aprender a olhar

Aja .
O tempo escorre onde
você se escora no falso tédio
das horas .
Teu trabalho – fundamental que seja
-é mero tecer de cotidianos
onde você veste sua mortalha de dormir
onde enterras teu dia
que ressuscita à espera da tua real ação .
Teu verdadeiro serviço é o tempo
que costura na ação
por cada pessoa
com quem escolhe
valer a pena agir .
São poucas , são únicas
e elas passam como sombras
que ficam como cicatrizes
na memória do que você
não sabe do que perdeu .
Aja .
A vida não é um milagre .
A vida é a busca de um milagre
que a justifica
que pode passar por você
como uma faca que corta
tua real oportunidade .
Aja . Saiba agir . Aprenda a agir
Aprenda a ver direito para saber
se aproximar direito do que compensa tocar
do que compensa amar
para saber acordar
da letargia da tua ação errada .
Aja . Sentado , imóvel , pensando
sobre teu desejo oco
sobre o amor que tens
pela vontade de amar
na direção errada
que não é amor
que desperdiças em ações erradas
em pessoas erradas .
Aja .
O tempo escorre .
As oportunidades escorrem
As pessoas reais
que não enxergas
por onde deves agir
escorrem
ao teu lado
e melam
tua dura e móvel
inação .

Aja .
O tempo escorre onde
você se escora no falso tédio
das horas .
Teu trabalho – fundamental que seja
-é mero tecer de cotidianos
onde você veste sua mortalha de dormir
onde enterras teu dia
que ressuscita à espera da tua real ação .
Teu verdadeiro serviço é o tempo
que costura na ação
por cada pessoa
com quem escolhe
valer a pena agir .
São poucas , são únicas
e elas passam como sombras
que ficam como cicatrizes
na memória do que você
não sabe do que perdeu .
Aja .
A vida não é um milagre .
A vida é a busca de um milagre
que a justifica
que pode passar por você
como uma faca que corta
tua real oportunidade .
Aja . Saiba agir . Aprenda a agir
Aprenda a ver direito para saber
se aproximar direito do que compensa tocar
do que compensa amar
para saber acordar
da letargia da tua ação errada .
Aja . Sentado , imóvel , pensando
sobre teu desejo oco
sobre o amor que tens
pela vontade de amar
na direção errada
que não é amor
que desperdiças em ações erradas
em pessoas erradas .
Aja .
O tempo escorre .
As oportunidades escorrem
As pessoas reais
que não enxergas
por onde deves agir
escorrem
ao teu lado
e melam
tua dura e móvel
inação .

A pior falta é do que nunca foi
e prometia ter sido .
A promessa do amor que não houve
O ideal da pessoa que não se cumpriu .
A pior falta é de quem ainda vive
na ausência a ser preenchida
pela tua esperança de construir
alguém que ainda ressuscita cotidianamente
na tua memória traída pela ausência da palavra , da ação dela que nunca veio .
A pior falta é daquele pequeno gesto
que você deixou de fazer
que poderia ter preenchido toda a falta
de um futuro que você sabe incerto
mas que te dói mesmo assim
por tua esperança desesperada
por tudo que haveria de ter sido
e ainda não é .
A pior falta é causada
por este ainda
que te afunda na mais funda esperança
que não te mata nunca
e te enterra
nesta falta eterna
que te atravessa .
Pior falta é da tristeza ausente
daquela
por quem você se entristece
Pior presença é da vida alegre
e indiferente
a quem você cria
como sombra que te ampara .
Pior falta é de você mesmo
pela culpa de tudo que você
poderia ter feito e jamais sabe
ter deixado de fazer .
Não te faltam porém
teus pés que caminham sobre o chão
de um planeta que flutua no espaço infinito
que habita entre tuas faltas .