Castelo
Poesia
Castelo
Oratória
Pela palavra o gosto telúrico de um suave senso de sentido
o fruto humano e pragmático do verbo original
abocanhando o termo transcendente em escultura chã
Pela palavra a carne feita verbo
o claustro da realidade inalcançável
o indizível a ser composto em sintaxe
o caos fruto do sistema impenetrável
de acertos vários e hiatos infinitos
Pela palavra a criação dos fatos e edificação da história
perplexa e precária captura dos afetos
a criação do ser
aos moldes do discurso inventado que o define
Pela poesia o avesso o estilhaçamento do sentido
(ou seu mesmo reflexo refundado)
tentativa fracassada e deleitável
de reencontro com o instinto primitivo
que reembaralha fins e princípios
que descortina o tempo
o verbo
o ser.
Calçamento e pavimentação da latino América
Mais um ditador cucaracha latino foi
para o beleléu: Pinochet deu adeus aos hermanos de acá para prestar
contas(e são muitas) no além.O mais curioso e estrambótico da coisa toda
é que o homem, assassino, truculento, canalha e imperdoável como ser
humano fez, do ponto de vista da economia, o melhor governo da história
do Chile, alavancando o país a um crescimento sustentável que permanece
até os dias de hoje, em que governos pseudo socialistas mantém as mesmas
bases da fundação econômica da época do caudilho.Allende, um bom rapaz
de nobilíssimas intenções humanistas, fez um governo de mierda.Pinochet,
uma verme assassino e corrupto, abriu a economia,cortou o estado e
elevou o padrão de vida dos chilenos.
Alguns esquerdistas de plantão dizem que a melhoria
na economia do Chile se deveu às inúmeras mortes e atrocidades cometidas
no governo autocrático de Pinochet:Um sofismão sem vergonha.Pinochet
TOMOU E SE MANTEVE no poder a custa dos seus métodos atrozes e
truculentos.O que melhorou a economia do Chile foi a implantação de
métodos rigorosamente liberais no desenvolvimento da economia chilena,
coisa que desespera a esquerda festiva, que só tolera ditaduras
truculentas quando são de esquerda.Pinochet matou e torturou milhares,
Stálin torturou e matou milhões.Sim, não se mede a canalhice de um
assassino pelo número dos que matou, mas tem uns tantos que
ainda defendem Stálin porque dizem que o facínora visava um mundo
melhor.Ora, até o mais canalha dos seres tem lá suas boas intenções(às
vezes o canalha nem se imagina canalha, o que não é raro).Sei lá eu se
Pinochet era um canalha auto consciente ou se tinha lá algumas intenções
nobres distorcidas. O fato é que, de uma maneira ou de outra,ambos,
Stálin e Pinochet devem estar calçando os infernos com suas utopias
pessoais no momento.
Mas, de qualquer maneira,não deixou de ser
constrangedor ver alguns meios de comunicação quase que dizer de
mansinho que a economia chilena melhorou-e muito-durante seus anos mais
terríveis, quando liberdades pessoais eram tiradas, vidas tomadas e
corpos dilacerados.Um acerto não justifica um erro e nem vice
versa.Pinochet foi um monstro como ser humano mas seu governo deu
um rumo certo do ponto de vista econômico ao seu país.As
contradições e ambiguidades devem ser lidas através da história como
exatamente são:contradições e ambiguidades.Até porque o ser humano e a
história são essencialmente ambíguos.O governo Pinochet é um exemplo
flagrante neste sentido, embora o saldo de uma ditadura seja
sempre inexoravelmente negativo.
Agora, Fidelito está também à beira da morte.Também matou e torturou
em nome de uma causa, mas tem banca bem maior que Pinochet porque é de
esquerda, como Stálin.Vejamos se será também defenestrado depois de
defunto.Eu duvido muito.Se a direita governa melhor, a esquerda, por
sua vez, tem um marketing bem mais eficiente.Canalha por canalha, eu
particularmente fico com nenhum.Mas que, a meu ver, as idéias que
reformaram a economia do Chile me soam bem mais interessantes que as que
colocaram Cuba no lugar de hoje, são sim.Milton Friedman e a turminha
de Chicago são bem mais palatáveis que a patota Leninista
mentecapta de Chávez(Fidelito semi-finado incluso).
Árvore
Edição
Recapturado o momento fugidio que não acontecera
Por entre os dedos o alívio tácito de um toque não consumado
entranhado nos póros de uma possibilidade atávica
Enclausurado o instante utópico
entre paredes vedadas de memória criativa
Decupada a doce angústia
que antecedia o íntimo reconhecimento
de uma permanente antecipação
Percorridos os cheiros, tateadas as nuanças, calculadas as formas
de um casulo atemporal, nicho estreito entre porvir e quase
Filtrada a fantasia perene de uma perda semi ganha
Vitória encantada de um fracasso tampouco concretizado
Reconduzidos hiatos e pausas aos recortes conformando
a concretude de um nada conquistado a desacertos convictos
Feito portanto por merecer seu repouso de sentido
na reconstrução dos incontáveis fragmentos
que ornamentam sua reinvenção
baseada nos falsos esquecimentos
e na ressurreição continuada de fatos deletéreos
revividos no corpo glorioso da desmemória voluntária.
Quitanda
Vendem-se verdades:
Cruas cozidas ásperas secas insípidas requentadas
para todos os gostos , aptidões e paladares
nos moldes definidos da safra ou opinião de cada estação
verdades mastigadas e regurgitadas para reconsumo cíclico
Vende-se a satisfação esquálida de um consolo provisório
de realidade provisória até que caiam de maduros
novos frutos vindouros de verdades pretéritas
em novíssimas embalagens
Cobra-se a tortura deleitável de um tormento fabricado
como soma e contraponto a uma previsível
desordem natural das contingências
Cobra-se a pretensa cura previamente apodrecida
que tampouco nos alivia do doce gostode uma mentira bem-intencionada
Em malefício do cliente, não nos responsabilizamos pelo contrapeso
da ingestão de meias verdades mal digeridas
e outras obviedades mal assimiladas
por razões e instintos gastro-metafísicos
Como cura, oferecemos as mesmas velhas questões,
sem nenhum encargo ou despesa extra.
Quem dá menos?
Mesquinharia, hipocrisia e queda de cabelo
Não há miséria ou desgosto pessoal
que não possa ser aplacado um tiquinho pela desgraça alheia, eis uma
verdade inconsciente, suja, mas universal.Não é a toa que a santidade é
um estado de exceção, e que todos os santos parecem padecer de uma certa
anomalia em sua psiquê.O estado natural do ser humano é a
mesquinharia.A tentativa de civilização foi uma maneira de domar a nhaca
pegajosa do comportamento das pessoas.Claro que outras tantas ninharias
nasceram deste mesmo processo civilizatório,o que corresponde dizer que
a mesquinharia humana é ilimitada mesmo.
Mas volto à frase primeva e ilustro a dita cuja com
exemplo próprio:tenho um ligeiro começo de calvície que me aflige, dadas
as proporções generosas do meu crânio.Dois amigos meus, mais jovens que
eu, apresentam já uma calva avançada e proeminente.Confesso:é um alívio
contemplar-lhes a fronte bem mais desemcapada que a minha, o que me
tira um certo peso dos ombros.Sei que o exemplo é mixuruca e fútil, mas
estou sem muita coragem de expor minhas vísceras com uma demonstração de
uma mesquinharia pessoal mais metafísica.Mas o negócio é que é assim
com tudo, compreendem? Não há uma estupidez pessoal
incontornável ou falta de talento estratificado que não possa
ser mitigado com uma carência ainda maior de valores do próximo(quanto
mais próximo, maior o alívio, aliás).Coisa boa a natureza humana não
socializar equanimemente virtudes e vícios, mas estabelecer um padrão
mais ou menos comum de equilíbrio-a mesquinharia- que suaviza e ameniza
os desacertos.Prova de que nem todo mal necessariamente vem pra mal,
dependendo das circunstâncias.
E ainda tem um bem intrínseco neste mal, um quê de revelação moral:
quem diz que não sofre dele, mente, possivelmente sendo mais mesquinho
ainda(não, não, os santos não dizem que não são mesquinhos:ao contrário,
dizem que são os piores dos seres,almejando tornarem-se os melhores
seres desta forma- que é um caso a parte de esquisitice).Em
suma, o sujeito que diz não sofrer de mesquinharia tem a mesma
multiplicada ad infinitum pela hipocrisia, vício que, por sua vez,também
tem lá suas virtudes, como, por exemplo, a de freio para instintos
desagradáveis de sinceridade extrema que podem causar danos irreparáveis
em amizades e relações amorosas.Mas aconselha-se a devida moderação em
ambos os vícios.Alguma hipocrisia é necessária, muita é sinônimo de
falta de caráter;alguma mesquinharia é vital à saúde mental, muita é
sinônimo de canalhice.Perigoso mesmo é a tentativa de anulação de
ambas, o que pode resultar em santidade , chatice, ou maluquice mesmo,
dependendo da enverdagura do sujeito.
Gênese
Álbum
Tudo é da minha conta
Discrição é um mito.Porcamente
fabricado.Manipulado por gentinha sem grandes ambições de espírito e
escassos de virtudes.Ora, se, como dizem os gnósticos, tudo é
manifestação divina, ou, como dizem os ”quânticos”, toda a matéria se
coaduna, então tudo é da minha conta,desde a derrota de Napoleão em
Waterloo ao problema de ejaculação precoce de um vizinho.Todos os
assuntos, todas as pequenezas, grandezas, minudências , particularidades
da vida alheia são do meu interesse.E quem é que vai mensurar aquilo
que é ou não do interesse coletivo? Um indivíduo? O Senso comum? Prefiro
meu próprio escrutínio, me basear em minhas idiossincrasias a
confiar nas idiossincrasias pseudo-normais do populacho que faz
apologia ao ‘’apelo universal’’’.Prefiro o meu universozinho particular,
uma vez que o Joseph Campbell já dizia que o universo conspira a
meu favor.
Me transformei em jornalista para isto mesmo:para dar
uns ares de sofisticação à minha mania obsessiva de revirar aquilo
que os socialmente corretos dizem não me dizer respeito.Mas até no
jornalismo descobri , para meu desgosto, regrinhas éticas elementares do
”zé povinho do interesse comum”.A questão é que se me dizem que o
negócio não me diz respeito, aí é que eu me interesso mesmo.É de uma
simplicidade freudiana elementar, percebem? A vida sexual alheia, o mau
hálito do meu inimigo, a sarna secreta de um conhecido, a falha dentária
da musa do telejornal, tudo é matéria do meu interesse.Eu, pedante
contumaz, aprendiz de literato, acredito que a base de toda a
literatura, e , por conseguinte, de todas as demais artes, é mesmo o
fuxico, a curiosidade patológica sobre os detalhes sobre tudo e
qualquer coisa que nos cerca.Por que fazer um poema sobre um pôr do
sol ou sobre o canto do bem-te-vi, se se
pode construir uma epopéia sobre a suposta infidelidade da
mulher de Ulisses?A arte é a prova absoluta que só o fuxico e a
indiscrição produzem maravilhas na história da humanidade.Arte discreta é
coisa de árcades pós-enrustidos. Homero já sacava muito bem deste
prazer encantador que é meter o bedelho na vida alheia e ainda
foi bem copiado por Joyce, o fuxiqueiro pós moderno.
A indiscrição tem inclusive um certo mérito de
pesquisa empírica, de desbravamento, de aventura e heroísmo pessoal.Só
um virtuoso de fato tem méritos suficientes para ser um bom fuxiqueiro e
desbaratar o universal naquilo que aparentemente não é da conta de
ninguém,e que, no fim das contas, se transforma nos mais augustos
interesses da arte,e, por conseguinte de novo, da humanidade.Só os
heróis se metem na vida alheia e fuxicam.Os medíocres e comezinhos
espiam discretamente, pisando delicadamente em ovos, para não
perturbarem a vida privada do vizinho broxa.